Um ano e meio depois, Polícia Civil inicia busca testemunha crucial em caso de chacina em chácara
Um ano e meio depois, a Polícia Civil iniciou a busca por uma testemunha que estava na chácara onde três pessoas foram mortas durante uma abordagem de policiais militares do Comando de Operações de Divisas (COD), próximo à BR-060, na saída de Goiânia para Abadia de Goiás. O problema é que esse jovem de 25 anos foi visto pela última vez por um caseiro vizinho, que o observou deixando o local correndo e afirmando que iria embora para o Tocantins "sem olhar para trás". Desde então, os policiais não conseguiram localizá-lo.
A busca pela testemunha começou após a reabertura do inquérito que investigou as circunstâncias das mortes do piloto Felipe Ramos Morais, de 35 anos, e dos mecânicos de aeronaves Paulo Ricardo Pereira Bueno, de 36, e Nathan Moreira Cavalcante, de 22, ocorridas em 17 de fevereiro de 2023. Os disparos foram efetuados pelo então comandante do COD, tenente-coronel Edson Luiz Souza Melo Rocha, que havia acabado de assumir o batalhão, e pelo major Renyson Castanheira Silva. O processo foi arquivado em agosto de 2023.
Em maio de 2023, a mãe de uma das vítimas relatou que havia visto essa testemunha e afirmou que sua existência foi ignorada pela Polícia Civil. Na época, essa informação foi desconsiderada. A mãe conversou com um caseiro que trabalhava em uma propriedade vizinha e ele contou a ela sobre o jovem. Tanto o caseiro quanto o proprietário da chácara haviam sido ouvidos pela delegacia na ocasião, mas nenhum deles foi questionado sobre a testemunha. Após diligências realizadas em outubro de 2024, a Polícia Civil solicitou mais tempo para tentar encontrá-lo.
No dia 21 de outubro, em um novo depoimento que durou menos de quatro minutos, o vizinho foi questionado pela primeira vez sobre a testemunha. Ele relatou que ouviu dela que não poderia falar sobre o que aconteceu no local, que não pararia para conversar e que precisava seguir em frente, sem olhar para trás. O vizinho também afirmou que o jovem deixou tudo na chácara e não viu nada sendo levado após o ocorrido. Durante a oitiva, o policial que o interrogou mencionou que o telefone da testemunha na época estava inativo, e não foram feitas mais perguntas.
Por pressão dos familiares das vítimas e do Ministério Público de Goiás (MP-GO), a Justiça recebeu um laudo pericial que indicava a ausência de pólvora no corpo de Felipe. Os parentes do piloto e dos mecânicos sempre sustentaram que os três foram executados, afirmando que não estavam armados e que o local era utilizado por Felipe apenas para manutenção de helicópteros. Felipe possuía uma empresa que realizava voos com essas aeronaves, e Paulo e Nathan eram contratados para auxiliar no trabalho.
Chácara Alugada
Em outubro, a Polícia Civil ouviu pela primeira vez uma pessoa que trabalhou para Felipe até um mês antes da morte do piloto. Essa testemunha foi a responsável por alugar a chácara onde a manutenção dos helicópteros era realizada. Ele afirmou que Felipe precisava de mais espaço para o trabalho, já que o local anterior não era suficiente. Assim, ele lembrou da propriedade próxima à BR-060 e assinou um contrato de locação "por um preço bem barato".
Segundo essa pessoa, ele trabalhou com Felipe por seis meses, mas se afastou porque o piloto não queria cumprir o pagamento combinado. Após essa saída, a locação passou a ser feita diretamente entre Felipe e o proprietário. A testemunha afirmou que o local era utilizado exclusivamente para a manutenção dos helicópteros e que, durante o tempo em que trabalhou lá, nunca viu armas ou drogas com Felipe ou com Nathan, outro mecânico que ele conhecia. Em relação a Paulo, ele disse que nunca o havia visto no local.
Funcionários de uma empresa vizinha à chácara também foram ouvidos. Um deles relatou que, além do tenente-coronel e do major, havia outro policial fardado que permaneceu na viatura, além de um civil que chegou em um Hyundai HB20 branco. Essa informação não foi mencionada no inquérito que foi arquivado em agosto de 2023, e esses policiais não foram ouvidos na ocasião.
Um dos funcionários afirmou que, dias após a abordagem que resultou nas mortes, dois homens à paisana, que se identificaram como policiais, estiveram na empresa e pediram para verificar as imagens das câmeras de segurança. No entanto, ele não soube informar se os vídeos foram levados. O inquérito não continha informações sobre as câmeras, que gravavam as imagens por um período de oito dias.
Versões
Os policiais que realizaram a abordagem na chácara alegam que foram até o local após receber informações sobre tráfico de drogas e que, ao chegarem, foram recebidos a tiros pelos suspeitos, o que justificou sua reação. Eles afirmam ainda que, após o suposto tiroteio, encontraram cocaína em um dos helicópteros e que os três estavam armados.
No entanto, não é possível afirmar se a versão apresentada pelos policiais é verdadeira, se se tratou de legítima defesa ou se houve um crime. No final de outubro, o processo reaberto foi colocado em sigilo pela Justiça.