Cães e gatos podem tratar convulsões e doenças crônicas com Cannabis Medicinal


 Cães e gatos podem tratar convulsões e doenças crônicas com Cannabis Medicinal Reprodução

Gamora é uma gata afetuosa que adora se aninhar no colo de sua tutora, Clíssia da Rocha, de 45 anos, e receber carinhos até adormecer. No entanto, ela sofria com crises epilépticas que a despertavam logo que pegava no sono, causando contorções, miados e salivação. Essa situação persistiu desde que foi resgatada há sete anos em Bertioga (SP). Recentemente, um veterinário sugeriu o uso de Cannabis medicinal, e agora Gamora tem apenas uma crise por ano.


No final de outubro, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou veterinários credenciados pelo CFMV (Conselho Federal de Medicina Veterinária) a prescrever medicamentos e produtos à base de Cannabis para tratar dores crônicas, doenças neurológicas e condições relacionadas ao envelhecimento dos animais.


Dois anos atrás, antes de iniciar o tratamento com produtos à base de maconha, Gamora era tratada com fenobarbital, um anticonvulsivo conhecido pela marca Gardenal, mas sem sucesso. "Ela tinha cerca de oito ataques por dia", recorda Clíssia. Além disso, a gata costumava se isolar, sem brincadeiras, completa a tutora.


Apesar da prescrição veterinária, conseguir um frasco para o tratamento dos animais não era uma tarefa fácil. Em 2015, a Anvisa autorizou médicos a prescreverem Cannabis medicinal, mas apenas para humanos, deixando os veterinários de fora. Aqueles que se arriscavam a prescrever usavam uma norma de 1998 que permitia a receita de medicamentos controlados, mas isso era considerado uma brecha que não protegia os profissionais de possíveis penalizações por contravenção e até tráfico de drogas.


A nova medida da Anvisa resolve essa questão. Segundo a agência, os veterinários agora podem prescrever esses produtos em receitas especiais, que serão retidas nas farmácias ou pet shops, assim como ocorre com outros medicamentos controlados, assegurando seu uso estritamente terapêutico. A norma também autoriza o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) a regulamentar a comercialização de produtos veterinários à base de Cannabis no Brasil no futuro, um processo que ainda está em estudo. Até lá, os veterinários poderão receitar os mesmos medicamentos utilizados em humanos.


A advogada Marcela Sanches lembra que, até então, os veterinários indicavam aos tutores associações de pacientes com as quais poderiam conseguir os medicamentos. A novidade, ela diz, dá mais autonomia ao profissional. "[A medida da Anvisa] dá mais segurança jurídica ao veterinário", afirma.


O CFMV —que junto com o Mapa pediu a alteração à Anvisa— mantinha desde 2022 um grupo de trabalho para analisar o uso da Cannabis na rotina clínica. Segundo a veterinária Caroline Campagnone, que integrou o grupo de trabalho do CFMV, a prescrição deve ter dosagens específicas para cada animal e enfermidade, e os bichos devem receber acompanhamento médico regular durante o tratamento.


"Eu gosto sempre de frisar que o veterinário pode agregar [Cannabis medicional] ao tratamento que ela já instituiu ao paciente", diz.


Campagnone afirma que estudos mostram que, além de aliviar dores, o extrato de Cannabis pode diminuir a frequência de convulsões e melhorar condições neurológicas, como a SDC (Síndrome da Disfunção Cognitiva Senil), uma forma de Alzheimer em cães. A veterinária também destaca que pesquisas indicam a eficácia de produtos à base de maconha na redução da ansiedade e do estresse em animais, incluindo gatos, cães, roedores e equinos.


Bóris, um cachorro aventureiro, acompanhou seu tutor, o empresário Rodrigo Addor, de 41 anos, em uma viagem à Alemanha, onde teve a oportunidade de conhecer a neve. Ao retornar ao Rio de Janeiro, o samoieda de 27 quilos parecia mais cansado e sem disposição. O problema não era apenas o calor, mas também sua idade avançada, já que ele tem 13 anos.


"Ele sente dor para se levantar. Tem problema no ligamento, na junta", diz Rodrigo.


O tutor entrou em contato com uma associação e começou a administrar a Bóris, pela manhã e à noite, gotas do extrato de Cannabis, pelo qual pagou R$ 373 (frasco de 10 ml), incluindo uma taxa para associados. Além do tratamento com o extrato, Bóris também está recebendo medicamentos convencionais prescritos por um veterinário para aliviar suas dores. Rodrigo relata que, desde então, Bóris tem conseguido descansar com mais tranquilidade à noite. "Ele dorme comigo no ar-condicionado e parece uma nuvem."





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