Bolsonaro admite ter estudado estado de sítio, nega tentativa de golpe e teme prisão iminente

Folha de S. Paulo
Bolsonaro admite ter estudado estado de sítio, nega tentativa de golpe e teme prisão iminente Reprodução

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta segunda-feira (25) que o estado de sítio foi considerado no final de seu mandato, mas negou ter liderado qualquer tentativa de golpe de Estado. Ele se pronunciou com jornalistas no aeroporto de Brasília, após voltar de uma viagem a Alagoas. Ao ser questionado sobre a possibilidade de ser detido em decorrência da investigação sobre a tentativa de golpe, ele respondeu que pode ser preso a qualquer momento.


"Eu posso ser preso agora, ao sair daqui [do aeroporto]", afirmou.


Ele reafirmou que a acusação de envolvimento no plano de golpe identificado pela Polícia Federal é "algo sério" e que uma ruptura institucional não poderia ser realizada por um general e alguns oficiais. A PF indiciou 25 militares, incluindo 7 generais e 18 oficiais.


"Tem que estar envolvidas todas as Forças Armadas, senão não existe golpe. Ninguém vai dar golpe com general da reserva e mais meia dúzia de oficiais. É um absurdo o que estão falando", disse Bolsonaro na área de desembarque de autoridades do aeroporto de Brasília.


"Da minha parte nunca houve discussão de golpe. Se alguém viesse pedir golpe para mim ia falar, tá, tudo bem, o 'after day'? E o dia seguinte, como é que fica? Como fica o mundo perante a nós. (...) A palavra golpe nunca esteve no meu dicionário.


O ex-presidente também negou ter conhecimento ou ter discutido qualquer plano que envolvesse prender ou assassinar o presidente eleito Lula (PT), o vice Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).


"Esquece, jamais. Dentro das quatro linhas não tem pena de morte", afirmou o ex-presidente.


Bolsonaro afirmou que a versão de que existiu um plano para assassinar autoridades foi uma "jogada" para "mostrar que 'estamos fora das quatro linhas'". Ele também reiterou os argumentos de sua defesa e de seus aliados, afirmando que nenhum plano golpista foi efetivamente colocado em prática.  "Não cola isso daí. Não sou jurista, mas no meu entender nada foi iniciado. Não podemos começar a punir e querer punir crime de opinião, de pensamento", declarou o ex-presidente.


Na semana passada, a Polícia Federal indiciou 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, sob suspeita de crimes como tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e organização criminosa, cujas penas variam de 12 a 28 anos de prisão, sem considerar agravantes. Os investigadores identificaram os suspeitos envolvidos em diversas ações golpistas em 2022, incluindo ataques ao sistema eleitoral e discussões sobre uma minuta de decreto para anular o resultado das eleições.


A corporação também está investigando um documento intitulado "Planejamento - Punhal Verde Amarelo", supostamente criado pelo general de brigada da reserva Mário Fernandes, ex-número 2 da Secretaria-Geral da Presidência da República. Esse plano incluiria a possibilidade de assassinar Lula, Alckmin e Moraes. De acordo com as investigações, Fernandes imprimiu esse planejamento no dia 9 de novembro de 2022 no Palácio do Planalto e, cerca de 40 minutos depois, teria se dirigido ao Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência, que na época era ocupada por Bolsonaro.


O ex-presidente não comentou vários aspectos específicos da investigação, especialmente porque políticos aliados e apoiadores foram convocados, dificultando as perguntas direcionadas a ele.


Ao negar a existência de uma trama golpista, ele afirmou que todas as medidas "dentro das quatro linhas" da Constituição foram consideradas, incluindo uma medida extrema: o estado de sítio. A Constituição prevê dois estados que podem ser acionados em casos de quebra da ordem social ou em situações de guerra e conflitos, sejam internos ou externos: o estado de defesa, mencionado na minuta que visava o TSE, e o estado de sítio, que é mais abrangente.


O estado de defesa é um dos instrumentos previstos na Constituição Federal para ampliar os poderes do chefe do Executivo, mas, segundo especialistas, seria inconstitucional no contexto citado por Bolsonaro, pois representaria uma interferência indevida do Executivo na Justiça Eleitoral. Por outro lado, o estado de sítio é um mecanismo que pode restringir ainda mais as liberdades individuais e deve ser utilizado apenas em casos de declaração de guerra, em resposta a ataques de outros países ou em situações extremas de instabilidade que não possam ser resolvidas com o estado de defesa.


Em fevereiro de 2024, agentes da PF encontraram uma minuta na sala de Bolsonaro na sede do PL em Brasília. O documento previa a declaração de estado de sítio e a decretação de uma operação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) após a derrota nas eleições. Uma versão anterior foi encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres, que decretava estado de defesa na sede do TSE.


Desde fevereiro, Bolsonaro tem adotado o discurso de que golpe "é tanque na rua", e não "usando a Constituição", e de que não existe golpe via estado de sítio.


"Apesar de não ser golpe o estado de sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da República e da Defesa para se tramar ou para se botar no papel a proposta do decreto do estado de sítio", afirmou Bolsonaro naquele mês.


Na entrevista desta segunda, Bolsonaro voltou a criticar o ministro Alexandre de Moraes, afirmando que "a mesma pessoa faz tudo e, no final, vota para condenar quem quer que seja".


O que Bolsonaro já disse sobre a decretação de estado de sítio:

30.mar.21

"Vamos falar nos limites da Constituição. Lá dentro, estão nas cláusulas pétreas o direito de ir e vir, bem como o direito ao trabalho, à dignidade. Quando se fala em estado de sítio, pessoal fala, eu não posso decretar. Quem decreta é o Parlamento. Não existe isso aí. E mesmo no estado de sítio, eu tenho limites e é para uma situação complicada de distúrbio…de qualquer parte do Brasil"


10.fev.24

"O presidente não decreta estado de sítio. Ouve o Conselho da República e encaminha para o Congresso. Isso não é golpe"


25.fev.24

"Agora o golpe é porque tem uma minuta do decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha santa paciência [...] apesar de não ser golpe o estado de sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da República e da Defesa para se tramar ou para se botar no papel a proposta do decreto do estado de sítio"


27.fev.24

"O que mais se fala na imprensa é uma minuta de estado de sítio, que [eu] queria dar um golpe em cima disso. Primeiro: ninguém dá um golpe em cima de dispositivo constitucional. E como acontece o estado de sítio? São 3 momentos, estado de guerra, se tiver para entrar num conflito; algo que comoção nacional ou quando o estado de defesa, que é o mais brando, não deu certo"


21.abr.24

"Estado de sítio é uma proposta que o presidente pode submeter ao Parlamento"


22.nov.24

"Eu jamais compactuaria com qualquer plano para dar um golpe. Quando falavam comigo, era sempre para usar o estado de sítio, algo constitucional, que dependeria do aval do Congresso"






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