Uso excessivo de antibióticos na pecuária gera bactérias super resistentes e ameaça tratamentos em humanos
A resistência antimicrobiana é considerada uma das maiores ameaças à saúde global no século XXI. Desde a descoberta da penicilina em 1928, os antibióticos revolucionaram a medicina, salvando milhões de vidas. No entanto, o uso indiscriminado desses medicamentos, especialmente na pecuária industrial, tem acelerado o surgimento de bactérias resistentes, colocando em risco os avanços médicos das últimas décadas. Existe uma profunda interconexão entre o uso de antibióticos em animais, a saúde humana e o meio ambiente.
Estima-se que cerca de 70% dos antibióticos consumidos globalmente sejam utilizados na criação de animais. Na pecuária industrial, são empregados para promover o crescimento dos animais e prevenir infecções em ambientes superlotados. Essa prática, embora economicamente vantajosa, cria um terreno fértil para o desenvolvimento de cepas bacterianas resistentes, que podem se disseminar para os seres humanos por meio do consumo de carne contaminada, do contato direto com animais ou pela contaminação do solo e da água. A consequência é alarmante: infecções que antes eram tratáveis tornam-se intratáveis.
A resistência antimicrobiana já é responsável por cerca de 1,3 milhão de mortes anuais, e esse número pode atingir 10 milhões até 2050, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS). Infecções simples, como urinárias ou de feridas cirúrgicas, podem voltar a ser fatais, revertendo décadas de progresso médico. Além disso, procedimentos que dependem de antibióticos para prevenção de infecções, como transplantes de órgãos e cirurgias, tornam-se mais arriscados. O uso indiscriminado de antibióticos na pecuária também compromete a segurança alimentar. Resíduos dessas substâncias na carne e a contaminação cruzada no processamento de alimentos são problemas sérios.
A liberação de resíduos de antibióticos no meio ambiente por meio de fezes de animais e sistemas de esgoto contribui ainda mais para a disseminação de resistência. Esses resíduos entram em ecossistemas aquáticos e terrestres, afetando a microbiota natural e ampliando a resistência em bactérias.
A solução para essa crise requer uma abordagem multidimensional. Regulamentações mais rígidas sobre o uso de antibióticos na pecuária são essenciais. Alguns países, como a Dinamarca, já demonstraram que é possível reduzir drasticamente seu uso sem comprometer a produtividade, implementando boas práticas de manejo animal. Além disso, é crucial promover a conscientização entre os consumidores. Escolhas alimentares mais conscientes, como o consumo de produtos orgânicos e livres de antibióticos, podem pressionar a indústria a adotar práticas mais seguras.
Investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos antibióticos também são fundamentais, mas devem ser acompanhados por estratégias para preservar a eficácia dos medicamentos existentes.
A resistência antimicrobiana é uma crise global que exige ação imediata. A colaboração entre governos, organizações internacionais, indústrias e consumidores é essencial para reverter esse cenário. O uso de antibióticos deve ser tratado como um recurso finito e precioso, com aplicação restrita e criteriosa. A proteção desse recurso não é apenas uma responsabilidade dos profissionais de saúde, mas de toda a sociedade
A preservação dos antibióticos como ferramenta essencial para a saúde humana depende de escolhas conscientes. Consumidores, governos e indústrias devem se comprometer com práticas responsáveis e sustentáveis. Com medidas adequadas, podemos não apenas evitar o agravamento da crise, mas também criar um mundo onde a saúde, a segurança alimentar e o equilíbrio ambiental coexistam de maneira harmoniosa.