Transplante de medula óssea não tem lista de espera e doação pode vir do exterior
Amanda Kai, executiva do mercado financeiro de 42 anos, não apresentava sintomas graves, apenas um cansaço que atribuía à rotina de trabalho e cuidados com a família. No entanto, durante exames de rotina, um hemograma alterado levantou suspeitas. Encaminhada ao hematologista, que solicitou novos exames, Amanda foi internada e diagnosticada com leucemia mieloide aguda. Em apenas uma semana, sua vida virou de cabeça para baixo.
“Foi um choque muito grande. Ninguém espera receber esse diagnóstico. Achei que o resultado fosse de outra pessoa”, compartilha Amanda, refletindo sobre o momento difícil.
Logo após o início do tratamento com quimioterapia, sua imunidade caiu drasticamente e ela contraiu uma infecção bacteriana multirresistente que resultou em pneumonia severa. "Fiquei intubada por cerca de cinco dias. Foi um período muito tenso, com risco de morte", relata.
O tratamento exigiu um transplante de medula óssea para restaurar seu sistema imunológico. A medula óssea é responsável pela produção de células sanguíneas, incluindo as que combatem infecções. Apesar da infecção, um doador compatível foi encontrado, mas ele não pôde doar devido a questões de saúde. A compatibilidade no transplante de medula óssea é determinada pelo HLA, um antígeno leucocitário humano, que varia de pessoa para pessoa e determina a probabilidade de rejeição ou sucesso do transplante.
Depois de algum tempo, Amanda recebeu a notícia de um novo possível doador com 90% de compatibilidade. Com cautela, ela se preparou para o procedimento. Finalmente, o transplante ocorreu com sucesso em agosto, no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Foram 17 dias de recuperação até que a nova medula começasse a produzir células sanguíneas.
A chance de encontrar um doador compatível não aparentado é rara, com uma probabilidade de 1 em 20 mil a 1 em 100 mil. A busca por um doador pode levar de dois a três meses. No Brasil, a conexão entre doadores e receptores é feita pelo Redome (Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea), o terceiro maior banco de doadores do mundo, com quase 6 milhões de inscritos. Em 2023, o Brasil realizou 1.694 transplantes de medula óssea, com cerca de 30% deles originados de doadores internacionais.
Danielli Oliveira, coordenadora do Redome, explica que a diversidade genética dos doadores brasileiros é um dos maiores valores do registro. A ampliação dessa diversidade é crucial para aumentar as chances de compatibilidade. Além disso, a idade dos doadores também é um fator importante, com doadores mais jovens apresentando melhores resultados para os pacientes.
Embora o Redome tenha uma grande quantidade de doadores, ainda existe uma limitação, já que entre 10% a 15% dos pacientes não encontram um doador compatível. Além disso, a busca por um leito para o transplante é outro desafio, principalmente no sistema público de saúde. Apesar da qualidade do atendimento, a disponibilidade de leitos é menor, o que agrava a situação dos pacientes.
Amanda, agora em remissão completa, completa 100 dias após o transplante, um período crítico no qual o paciente deve ficar isolado para evitar infecções. "Quero ver minha família e amigos e comer uma boa pizza. Esse vai ser meu presente de Natal", brinca. "Estou bem, mas sei que ainda há um longo caminho pela frente."
O Brasil enfrenta desafios tanto na busca por doadores quanto na oferta de leitos para transplantes. Em média, 3.000 brasileiros morrem a cada ano enquanto aguardam transplantes de órgãos, refletindo as dificuldades enfrentadas por pacientes como Amanda, que lutam pela vida enquanto dependem de doadores compatíveis.