Ozempic enfraquece diversidade e inclusão na moda
O desfile da Namilia na última semana de moda de Berlim evidenciou uma mudança significativa no cenário atual.
A marca, famosa por atrair celebridades como Kylie Jenner e Rihanna, parecia seguir a tendência das passarelas Y2K, com modelos magérrimas desfilando em cenários futuristas, evocando a estética da virada do milênio. Porém, em 2024, o foco foi uma regata estampada com a frase "I love Ozempic", o que causou um frenesi na internet, como era de se esperar.
A estratégia mirava o interesse de intelectuais pela moda, que mistura crítica e celebração daquilo que está sendo criticado. Esse tipo de abordagem permite às marcas uma ativação de imagem sem custos significativos, como foi demonstrado pela Benetton nos anos 90. Até aí, nada de novo.
O que chama a atenção é como o consumo de produtos e serviços de saúde se radicalizou, especialmente com substâncias como o Ozempic. A semaglutida e outros medicamentos semelhantes estão transformando a maneira como os consumidores lidam com suas dimensões corporais, gerando uma nova cadeia de consequências. A consultoria Goldman Sachs, por exemplo, prevê que esses efeitos serão tão profundos que impactarão até o PIB dos EUA. Segundo a Jefferies, mais de cem setores serão afetados, da aviação à indústria de próteses.
Os impactos psicológicos são ainda mais significativos. A semaglutida altera não só a forma física, mas também a confiança das pessoas, que muitas vezes buscam trocar o guarda-roupa devido à mudança no estilo pessoal. Esse fenômeno interfere diretamente na ideologia da moda, enfraquecendo a moda inclusiva, que defendia a ideia de que a gordura não precisa ser uma opção. No entanto, nem todos conseguem perder peso facilmente, o que coloca em questão a premissa de que ser gordo é uma escolha. Esse é um golpe adicional no movimento de diversidade e inclusão, que já sofreu com a eleição de Trump.
A organização da rotina ao redor do que se come também está passando por uma transformação. A semaglutida redefine a relação entre alimentos processados e bem-estar, o que afeta a maneira como as pessoas organizam seus intervalos ao longo do dia. A diminuição do desejo por certos alimentos altera a dinâmica das pausas no trabalho, algo que, para muitos, vai além da redução das porções.
Nos grandes centros urbanos, há um fenômeno conhecido como "rosto de Ozempic", caracterizado por uma aparência mais flácida e pálida, típica de quem perdeu peso rapidamente e sem planejamento. As clínicas dermatológicas estão repletas de queixas sobre isso, além do "bumbum de Ozempic" e a queda de cabelo, que afetam algumas pessoas. Esse novo perfil estético se contrapõe aos padrões de beleza otimizados para as redes sociais.
Nas clínicas de reprodução assistida, há relatos de mulheres que, depois de anos lutando contra a infertilidade, estão finalmente conseguindo engravidar após o uso da medicação para tratar a obesidade ou diabetes. Esse efeito, possivelmente relacionado ao restabelecimento da ovulação, afetada pelo sobrepeso, tem gerado o fenômeno das chamadas #OzempicBabies na internet.
Esses exemplos ilustram como as novas tecnologias, especialmente no campo da saúde, estão alterando o status quo de maneiras imprevisíveis e transgeracionais. E esse raciocínio deve ser aplicado a outras inovações do momento.