Musk usa seu poder para influenciar Congresso a favor de Trump
Quando Donald Trump começou a divulgar suas indicações para cargos de alto poder em seu Gabinete, muitos dos nomes despertaram atenção imediata, seja por estarem envolvidos em escândalos ou por serem considerados desqualificados para desempenhar tais funções. Para assegurar que seus indicados sejam confirmados sem resistência pelo Senado, apesar das controvérsias, o presidente americano tem uma carta poderosa em mãos: Elon Musk. O bilionário — que em breve terá um departamento novo para chamar de seu e gabinete na Casa Branca — tem usado de seu vasto poder financeiro — sua fortuna, segundo a Forbes, chega a US$ 428 bilhões (R$ 2,5 trilhões) — para pressionar e ameaçar congressistas que se mostram contrários às nomeações, levantando questões sobre o alcance de sua influência no novo governo.
Um exemplo das interferências de Musk a favor de Trump, segundo a revista Time, esteve em torno do nome de Pete Hegseth, indicado de Trump para chefiar o Pentágono. Hegseth, cuja confirmação ainda está pendente, enfrenta uma série de alegações de má conduta pessoal, incluindo agressão sexual — reforçadas por novas denúncias de uma ex-cunhada ontem, o que pode complicar sua situação. O ex-apresentador da Fox News e veterano do Exército nega veementemente as acusações, rejeitando-as como “difamações politicamente motivadas”.
Dadas as polêmicas, a indicação de Hegseth foi inicialmente vista com reservas pela senadora republicana Joni Ernst, de Iowa. A congressista, que concorrerá à reeleição nas legislativas em 2026, foi alvo de uma série de ataques nas redes de figuras pró-Trump e acabou cedendo na semana passada, declarando que votará a favor do apresentador.
A mudança de posicionamento, disse a Time, veio a partir da pressão exercida tanto por Trump quanto por Musk. Fontes próximas a Trump disseram à revista que o presidente estaria disposto a apoiar um adversário de Ernst nas primárias das eleições, e acrescentaram que o bilionário, por sua vez, ameaçou congressistas de enfrentarem um Super PAC (comitê de apoio político sem limites de contribuição) multimilionário para tirá-los do cargo caso votem contra os indicados.
Musk já havia falado abertamente sobre isso em sua plataforma X: “Aqueles que se opuserem à reforma perderão suas primárias/eleições”, avisara em dezembro, em resposta a um post do ativista conservador Charlie Kirk — que, por sua vez, também intimidava um outro congressista republicano a respeito de uma das indicações duvidosas de Trump.
Além de Hegseth, há outras escolhas pouco ortodoxas de Trump ainda na fila da confirmação por membros do Senado nas próximas semanas, como a ex-deputada democrata Tulsi Gabbard, como diretora de Inteligência Nacional, e Robert F. Kennedy Jr., para liderar o Departamento de Saúde e Serviços Humanos.
Mas as interferências de Musk não são novidade e vão além das nomeações do presidente americano para seu Gabinete. Antes mesmo da posse de Trump, o bilionário, que investiu cerca de R$ 1,6 bilhão na campanha de eleição do republicano, usou sua influência para pressionar o Congresso americano a rejeitar um plano bipartidário de financiamento do governo. Em seu lugar, defendeu uma proposta apoiada por Trump, recorrendo a ameaças e até mesmo à propagação de informações falsas.
Pelo X, Musk publicou uma avalanche de mensagens exigindo que os republicanos retirassem seu apoio ao acordo já negociado com os democratas no fim do ano passado, ameaçando retaliar aqueles que discordassem. Defendendo os interesses de Trump, o bilionário não hesitou em divulgar informações falsas sobre o projeto bipartidário, incluindo acusações infundadas de que o texto previa novos fundos para a Ucrânia e a construção de um estádio em Washington.
A proposta apoiada por Trump e defendida com unhas e dentes por Musk acabou sendo rejeitada no final das contas, mas tal ação causou alarde entre alguns republicanos do Congresso, especialmente por suas ameaças contra legisladores. Outros, porém, não se mostraram tão preocupados com as missivas de Musk, desdenhando-as como parte do jogo da política em Washington.
— Já enfrentei primárias quatro vezes, e sou mais do tipo rebelde. Se você me ameaça, finco o pé e não reajo — disse ao site americano The Hill um parlamentar republicano, em anonimato, sobre as ameaças de Musk relacionadas às primárias naquela ocasião. — Todos esses influenciadores nas redes sociais estavam contra mim na última primária, com milhões de seguidores, e eu não recuei nem um pouco.
'Abalar o sistema'
Ainda assim, as preocupações são justificadas. Musk em breve assumirá um papel ativo na administração Trump, liderando o recém-criado Departamento de Eficiência Governamental (Doge, na sigla em inglês), feito sob medida para ele. Trabalhando ao lado de Vivek Ramaswamy — que desistiu de sua candidatura à Presidência para apoiar Trump — Musk propõe cortes ambiciosos e promete “abalar o sistema” com uma “reforma drástica”. Embora pouco se saiba ainda sobre como ele atuará, o projeto já levanta sérias dúvidas sobre as regras para não políticos que exercem poder no governo.
A proximidade com Trump e seu círculo pessoal também é motivo de observação. Desde a eleição, Musk tem visitado regularmente o resort de Trump em Palm Beach, Flórida, participando de ligações e reuniões com potenciais candidatos a cargos no Gabinete e líderes mundiais. O bilionário vem pavimentando essa aliança há muito tempo, passando de interações ocasionais com o republicano para uma colaboração mais estreita ao longo dos anos. Tal proximidade de Musk — e outras das pessoas mais ricas do mundo — com a nova administração levou o ex-presidente Joe Biden a alertar, em seu último discurso antes de deixar o cargo, sobre uma crescente oligarquia de bilionários da tecnologia nos EUA.
Lado frágil na relação
Mas há um lado frágil nessa relação, que, para muitos especialistas, tem prazo de validade. Além das questões com os congressistas republicanos, Musk também já enfrentou resistência de influentes aliados de Trump, como Steve Bannon, devido ao seu apoio a vistos para trabalhadores estrangeiros qualificados, contrariando a premissa do Maga (Torne a América Grande Outra Vez), slogan de Trump.
Como convidado de destaque na posse de Trump, Musk também atraiu a atenção para si durante o evento, quando subiu ao palco da Arena Capital One para discursar e encerrou sua fala com um gesto interpretado por muitos como uma saudação nazista. Críticos, incluindo historiadores e sobreviventes do Holocausto, condenaram a ação, enquanto apoiadores atribuíram o gesto ao “entusiasmo desajeitado” de Musk. Ele, por sua vez, desdenhou das críticas e disse se tratar de um “ataque batido”.