O grupo japonês Fuji Media teve um início de 2025 desastroso. A reputação de sua emissora de TV, uma das principais do Japão, está em ruínas devido a um escândalo de assédio sexual envolvendo um de seus apresentadores mais famosos, que dominou as manchetes no país em janeiro.
Anunciantes abandonaram a empresa, que reduziu drasticamente sua previsão de lucros, enquanto altos executivos renunciaram em desgraça.

A companhia tornou-se um símbolo de disfunção corporativa, evidenciada por uma coletiva de imprensa na qual câmeras de televisão e alguns meios de comunicação foram proibidos de participar.  Em seguida, a empresa realizou uma segunda coletiva, que se estendeu por inacreditáveis dez horas, durante as quais jornalistas pressionaram a diretoria até as duas da manhã.

Diante desse cenário, pode parecer surpreendente que as ações da empresa tenham disparado 45% neste ano, tornando-se o melhor desempenho do índice de referência Topix.

Como isso é possível? 

O motivo dessa aparente contradição é que investidores enxergam uma oportunidade no caos da empresa. Além de ser uma das maiores emissoras do país, a Fuji Media possui imóveis de alto valor em Tóquio e Osaka.
Com uma nova liderança, espera-se que a empresa se torne mais receptiva aos acionistas e melhore sua governança corporativa.
— A Fuji Media possui uma fascinante variedade de negócios — disse Richard Kaye, gestor de portfólio da Comgest Asset Management.

— As pessoas estão bastante animadas com a possibilidade de mudança na administração.
Escândalo impulsiona ações
A crise da Fuji Media começou com uma reportagem de um tabloide local, em dezembro, revelando que um apresentador de TV de destaque assediou sexualmente uma mulher.
O astro, Masahiro Nakai, reconheceu que houve um "problema" e chegou a um acordo com a suposta vítima, embora tenha negado o uso de violência. Após a revelação da história, ele se aposentou do mundo do entretenimento. 

A Rising Sun Management, assessora de investimentos do Nippon Active Value Fund, um dos acionistas da Fuji tem sido uma das maiores críticas da forma como a empresa lidou com as acusações. Em uma carta pública, classificou a primeira coletiva de imprensa da Fuji Media como "um verdadeiro desastre" e exigiu que a emissora criasse um comitê independente para investigar o caso.

O Nippon Active Value Fund e a Dalton Investments, ambos administrados por James Rosenwald, são juntos o terceiro maior acionista da Fuji Media.
A Rising Sun também pediu, em uma carta enviada na segunda-feira, a renúncia de Hisashi Hieda, membro do Conselho de Administração da Fuji Media e da Fuji Television.

Movimentação estratégica
A rápida valorização das ações da empresa também gerou especulações de que outros investidores ativistas estejam se posicionando na companhia.
No ano passado, investidores ativistas bateram recordes de investimento no Japão, tornando o país o segundo maior mercado mundial para essa estratégia.

No total, esses investidores adquiriram pelo menos 1,2 trilhão de ienes (7,7 bilhões de dólares) em ações japonesas, segundo dados da Bloomberg Intelligence.
O setor imobiliário tem sido um dos focos desses investidores. A Elliott Investment Management adquiriu participação na Tokyo Gas Co. e pressionou a empresa a vender parte de seu portfólio de imóveis. A Sapporo Holdings Ltd. enfrentou pressão semelhante da 3D Investment Partners.

O setor imobiliário também está no centro da disputa entre a KKR & Co. e a Bain Capital pela Fuji Soft Inc.
Embora a Fuji Media seja conhecida por sua icônica sede com estrutura esférica no distrito de Odaiba, perto da Baía de Tóquio, a empresa também possui prédios comerciais, condomínios, hotéis, lares para idosos, centros logísticos, resorts e até dois aquários.

O famoso edifício com estrutura esférica da Fuji Media, destaque do distrito de Odaiba, às margens da Baía de Tóquio
Kiyoshi Ota/Bloomberg
Agora, alguns investidores especulam que a empresa venderá parte de seu portfólio imobiliário para financiar recompra de ações e pagamento de dividendos.
Ações baratas
Além disso, as ações da empresa estão baratas. No fim do ano passado, elas eram negociadas a 0,44 vezes o valor contábil, comparado a 1,45 vezes o valor contábil do índice Topix, segundo dados da Bloomberg.

A empresa também acumula pelo menos 69 bilhões de ienes em ganhos não realizados em seu portfólio imobiliário, de acordo com o Goldman Sachs.
— Se houver mudanças na gestão, os custos de capital e os preços das ações se tornarão mais relevantes para a administração, e a empresa pode vender ativos, como terrenos e edifícios, e recomprar ações — afirmou Hiroaki Tomori, gestor executivo de fundos da Mitsubishi UFJ Asset Management.
Investigação em curso
A Fuji Media anunciou que criará uma comissão independente para investigar o caso, com um relatório previsto para ser divulgado até o fim de março.

Um porta-voz da empresa não respondeu a perguntas sobre a possível venda de imóveis ou outras mudanças.
A Fuji tem sido protegida da influência de investidores estrangeiros porque a legislação japonesa proíbe que possuam mais de 20% de participação em emissoras de TV. Além disso, a empresa mantém participações cruzadas com outras companhias do setor, como a Toei Animation Co., a Toho Co. e a Dentsu Group Inc., a maior agência de publicidade do Japão.

Tradicionalmente, essas participações cruzadas garantem acionistas aliados que apoiam a administração da empresa.
— O momento em que surgir alguma pressão para a mudança da gestão e para a remoção desse modelo antiquado e entrincheirado, a verdadeira valorização dos ativos da empresa poderá ser percebida pelos acionistas — disse Zuhair Khan, gestor de fundos da UBP Investments. — Até agora, isso tem sido praticamente impossível.
Initial plugin text