Juros e endividamento ameaçam capacidade de pagamento de empresas

Estadão
Juros e endividamento ameaçam capacidade de pagamento de empresas Reprodução

Após um período de dois anos de recuperação, as empresas no Brasil estão novamente lidando com um cenário de elevado endividamento e dificuldades em cumprir suas obrigações financeiras, conforme indicam pesquisas de empresas especializadas em reestruturação de dívidas. Nos últimos três anos, apenas em três momentos na última década, as empresas conseguiram melhorar sua capacidade de pagamento.

Com a previsão de juros elevados e um crescimento do PIB menos robusto nos próximos dois anos, essa situação tende a persistir — e possivelmente se agravar — especialmente devido às incertezas criadas pelas guerras comerciais iniciadas por Trump, conforme apontam especialistas. Em suma, isso sugere que o número de pedidos de recuperação judicial e reestruturações financeiras pode crescer ainda mais neste ano.


O cenário de dificuldades financeiras abrange toda a economia, afetando especialmente as empresas de menor porte. Segundo uma análise da consultoria financeira Sêneca Evercore, 120 companhias de capital aberto com poucas transações na Bolsa (conhecidas como small caps) precisariam de quase três vezes o valor de sua geração de caixa anual para quitar suas dívidas, considerando os últimos dois anos. Em 2021 e 2022, esse indicador era em média próximo de duas vezes.

Em contrapartida, o índice de cobertura (que avalia a capacidade de honrar apenas os custos financeiros) caiu de 2,6 em 2021 para 1,3 em 2023 e subiu para 1,4 no ano seguinte. Um índice mais alto indica uma maior capacidade da empresa de arcar com suas despesas financeiras. “Isso é apenas o gasto com custo de dívida”, afirma Daniel Wainstein, sócio da Sêneca Evercore. “Se pensar que elas ainda têm impostos, investimentos e despesas recorrentes, fica evidente que a capacidade de pagamento está comprometida.”

Um levantamento realizado pela empresa de reestruturação RK Partners com 307 companhias de capital aberto revelou que 25% delas atualmente não conseguem arcar com suas despesas financeiras. Além disso, quase metade (47%) enfrenta uma situação financeira crítica, apresentando uma dívida líquida entre três e seis vezes maior do que a sua geração de caixa.

“Para o nível atual de taxa de juros, qualquer empresa que tenha dívida superior a 2,5 vezes a geração de caixa já está muito endividada”, afirma Ricardo Knoepfelmacher, o Ricardo K, sócio da RK Partners. “As empresas atravessaram a última década em dificuldade, com alguns períodos curtos de menor dificuldade.”

Com exceção do término da pandemia e do governo Temer, quando os juros apresentaram uma tendência de queda e o PIB demonstrou vigor, a média de empresas com alta alavancagem permaneceu em torno de 44% desde 2014. Os momentos mais críticos ocorreram durante a crise do governo Dilma, quando 35% das empresas estavam incapazes de honrar suas dívidas financeiras e 54% estavam severamente alavancadas.

“Os juros baixos de 2020 e 2021 fizeram com que muitas empresas se endividassem para fazer aquisições, num período em que o preço dos ativos estava caro”, diz Ricardo Lacerda, sócio do banco de investimentos BR Partners. “Quando os juros subiram de maneira rápida, muitas empresas foram pegas de surpresa.”

No atual contexto, os bancos novamente reduziram a oferta de crédito. Um estudo da RK Partners, baseado em dados do Banco Central, revela que as taxas de juros cobradas das empresas pelas instituições financeiras aumentaram, em média, 31,4% entre janeiro de 2024 e janeiro de 2025.

O Santander liderou esse aumento, com a taxa de juros para empréstimos de capital de giro com prazo superior a um ano subindo de 35,5% para 50,9%, o que representa um crescimento de 43,3%. O Itaú também registrou um aumento significativo, de 43%, com as taxas passando de 21,3% para 30,9% no mesmo período. Em contrapartida, os bancos públicos, como a Caixa e o Banco do Brasil, foram os que menos elevaram os juros, com aumentos de 26,6% e 12,8%, respectivamente.

Como consequência, tem-se visto um aumento no número de reestruturações e renegociações de dívidas, assim como nos pedidos de recuperação judicial e extrajudicial. A análise da RK Partners, sustentada por dados da Serasa Experian, indica que os pedidos de recuperação judicial entre pequenas empresas cresceram 70% nos últimos dois anos. Para empresas de médio porte, que faturam até R$ 300 milhões anualmente, o crescimento foi de 35%. Mesmo as grandes empresas, que geralmente têm acesso a crédito mais favorável, enfrentaram dificuldades: os pedidos de proteção contra credores aumentaram 8% entre o quarto trimestre de 2022 e o mesmo período do ano passado.


“Essa situação leva um tempo para se consolidar, após o aumento das taxas de juros”, diz Ricardo K. “Os balanços do quarto trimestre devem mostrar uma situação ainda mais difícil.”





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