Nova tarifa dos EUA sobre aço começa a valer hoje; veja como afeta o Brasil

Estadão
Nova tarifa dos EUA sobre aço começa a valer hoje; veja como afeta o Brasil Reprodução

A tarifa de 25% sobre a exportação de aço e alumínio do Brasil para os Estados Unidos foi implementada nesta quarta-feira, 12, conforme confirmado pela Casa Branca. Na terça-feira, os fabricantes de produtos siderúrgicos e de metal não ferrosos ainda esperavam, ao menos, uma prorrogação das medidas por 30 dias, o que lhes daria mais tempo para aprofundar negociações com as equipes de comércio exterior do governo de Donald Trump. Contudo, os Estados Unidos anunciaram que não haveria exceções a essa medida.

O Brasil é um dos principais exportadores de aço para os Estados Unidos, com cerca de 90% do que é enviado para o país sendo material semiacabado (placas). As siderúrgicas americanas importam esse tipo de aço para processá-lo e utilizá-lo na fabricação de diversos produtos, como automóveis, eletrodomésticos e maquinário.

Apesar de ser a quarta maior indústria siderúrgica do mundo, a oferta de placas nas unidades de laminação independentes nos Estados Unidos é deficitária, o que força essas empresas a importar de diferentes países, incluindo Canadá, Brasil, México e Coreia do Sul. Somente o Brasil, de forma direta e através do México, enviou 5,3 milhões de toneladas em 2024.

Trump, em seus pronunciamentos, afirma querer eliminar o que considera "importações que ameaçam a soberania do país". Em 2018, durante sua presidência, ele implementou a Seção 232, que impôs a mesma tarifa de 25% sobre o aço e alumínio de vários países, levando o Brasil a negociar um regime de cotas. Dessa negociação, foi estabelecido um limite de 3,5 milhões de toneladas de placas e 687 mil toneladas de aços laminados permitidos sem a sobretaxa. Para o alumínio, a tarifa definida foi de 10%.

Três siderúrgicas brasileiras que podem ser mais prejudicadas pelas tarifas de Trump, caso não seja estabelecido um arranjo que prorrogue o sistema de cotas, são a ArcelorMittal e a Ternium, que fabricam placas e direcionam a maior parte de sua produção para os EUA, além da CSN, que exporta produtos laminados de alto valor agregado. A Usiminas realiza apenas vendas ocasionais para o mercado americano.

No setor de alumínio, a CBA, que pertence ao grupo Votorantim, é a mais impactada, uma vez que exporta produtos laminados (folhas), embora essa quantidade represente menos de 5% de suas vendas totais. Dados da Associação Brasileira do Alumínio (Abal) mostram que os embarques para os EUA corresponderam a 17% (US$ 267 milhões) do total exportado pelo setor no ano anterior, que foi de US$ 1,5 bilhão. Algumas empresas, como a Hydro, não realizam exportações para os EUA.

Por outro lado, a Gerdau deverá, a princípio, se beneficiar da proteção que Trump busca oferecer aos produtores locais. A empresa, além de não vender para o mercado americano, possui fábricas de aço (produtos longos comuns e especiais) nos Estados Unidos, onde obtém 40% de sua receita anual. De acordo com analistas, a Gerdau pode ter um incremento significativo em seus ganhos devido ao aumento dos preços do aço, que já estão ocorrendo desde fevereiro no mercado americano.

Um especialista do setor informou ao Estadão que alguns tipos de produtos siderúrgicos planos já apresentaram elevações superiores a 15% nos preços. A tonelada de aço plano (placa) aumentou cerca de US$ 100 devido à possibilidade de uma tarifa de 25% sobre todos os aços importados. Essa alta tem refletido em diversos segmentos da cadeia produtiva.


Governo brasileiro à frente do embate

Desde o início, as negociações com os EUA foram atribuídas, por uma questão de estratégia, ao vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin, e ao ministro de Relações Exteriores (MRE), Mauro Vieira.

O setor está pleiteando a renovação das cotas de exportação. Toda semana, representantes da indústria siderúrgica do País se reúnem no Mdic, em Brasília, para apresentar subsídios que sustentem as negociações.

Na semana passada, após várias tentativas, Alckmin e sua equipe tiveram uma conversa de quase uma hora com Howard Lutnick, secretário de Comércio de Trump, e Jamieson Greer, representante comercial dos EUA (USTR). De acordo com informações publicadas pelo Estadão na sexta-feira, 7, Lutnick e Greer se comprometeram a levar a Trump o pedido para adiar a data (12 de março) da implementação das tarifas sobre dois produtos brasileiros.

Em contrapartida, os americanos solicitam a abertura de um diálogo sobre o imposto de importação que o Brasil aplica ao etanol proveniente dos EUA, considerado elevado (18%). Segundo fontes que participaram da reunião, realizada por teleconferência, Alckmin e os assessores de Trump planejam se comunicar novamente nesta semana, e desde então têm trocado informações técnicas.

As empresas de aço e alumínio, assim como o Instituto Aço Brasil e a Abal, optaram por não se manifestar sobre a sobretaxa, aguardando o desfecho das negociações do governo brasileiro com os representantes comerciais de Trump.


Exportadoras sob a mira de Trump

A ArcelorMittal, maior produtora de aço do Brasil, possui duas siderúrgicas de placas, com uma capacidade anual de exportação de cerca de 6 milhões de toneladas. Desse total, quase 5 milhões são destinados à usina de laminação de bobinas de Calvert, no Alabama (EUA), através de embarques diretos via México. Essa laminadora é uma joint venture com a Nippon Steel. O restante é direcionado a outros clientes e usinas do grupo na Europa.

Uma das siderúrgicas de placas da ArcelorMittal está localizada em Serra, no Espírito Santo, e a outra no Ceará, no complexo industrial e portuário de Pecém. Essas operações são estratégicas para atender as demandas do grupo no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa.

A Ternium, controlada pelo grupo ítalo-argentino Techint, possui uma siderúrgica no Rio de Janeiro, chamada Ternium Brasil, com capacidade para produzir 5 milhões de toneladas de placas por ano. Atualmente, a empresa atende principalmente as laminadoras do grupo no México, destinadas às plantas de laminação da companhia, além de um volume menor para suas unidades na Argentina.

Das quase 687 mil toneladas de cotas de produtos acabados, cerca de um terço se refere a material vendido pela CSN − aços zincados e galvanizados, que somam cerca de 230 mil toneladas. Para folhas metálicas, a cota é de 14 mil toneladas. Pessoas ligadas à empresa comentaram que, mantida a tarifa de 25% sobre esses produtos, a empresa ficará totalmente fora do mercado americano.


Pressão das ‘big steel companies’

Na avaliação de investidores em companhias produtoras de aço, conforme outro especialista do setor, Trump usa a ameaça da sobretaxa para iniciar negociações com um poder de barganha maior, numa situação mais favorável, nas relações bilaterais de comércio dos EUA com outros países.

Na realidade, dizem, ele sabe que adotar tarifas sobre o aço são movimentos inflacionários, pois o país é dependente da importação de fora para completar o suprimento da siderurgia local.

O argumento do governo brasileiro é que o aço semiacabado é matéria-prima de muitas siderúrgicas americanas que só fazem produtos laminados. Portanto, é avaliado como estratégico para o país contar com esse tipo de material do Brasil. Mas há uma forte pressão por parte das três principais siderúrgicas do país: US Steel, Cleveland-Cliffs e Nucor. Contrárias a manter cotas ou isenções para aço importado, elas enviaram carta ao presidente reforçando sua posição na semana passada.


O mercado dos EUA movimenta próximo de 100 milhões de toneladas de aço ao ano, entre produção própria (80 milhões de toneladas) e material importado. As dúvidas são as contrapartidas que Trump pode pedir para manter as cotas.

EUA têm superávit nas trocas do setor

Na cadeia siderúrgica, a balança comercial entre Brasil e EUA pesa a favor dos americanos, de acordo com informações de Marco Polo de Melo Lopes, presidente executivo do Aço Brasil. O comércio é favorável aos EUA em mais de US$ 3 bilhões.

O grosso da exportação do Brasil é aço semiacabado, de menor valor agregado, enquanto as importações somam mais de US$ 7 bilhões, incluindo US$ 1,4 bilhão de carvão metalúrgico (insumo na fabricação de aço), equipamentos e outros bens de alto valor agregado.

Se as tarifas de Trump forem efetivadas, a avaliação é de que a siderurgia brasileira, como um todo, será afetada, pois é um grande mercado que se fecha a seus produtos. O Brasil é um dos maiores exportadores de aço do mundo, com 9,6 milhões de toneladas despachadas em 2024, o que gerou divisas de US$ 7,66 bilhões, conforme dados oficiais do Mdic, informados nos boletins do Aço Brasil.




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