Agro brasileiro no fogo cruzado das tarifas: é preciso estratégia e cautela

Neste contexto, surge a dúvida sobre possíveis oportunidades para os exportadores brasileiros. Contudo, é importante destacar que guerras comerciais tendem a ser prejudiciais para todos os lados: em um cenário global altamente interconectado, esse tipo de conflito gera incertezas, eleva custos, paralisa investimentos e provoca desemprego.
Apesar disso, é possível identificar nichos em que o Brasil pode ampliar sua presença no mercado chinês, caso as tarifas sobre produtos dos Estados Unidos persistam por um tempo considerável.
Durante o último conflito comercial entre Estados Unidos e China (2017–2018), o Brasil foi beneficiado pelas retaliações chinesas, com aumento nas exportações de soja, milho e carnes. Agora, com novas medidas semelhantes, surgem expectativas parecidas — mas com importantes limitações.
Primeiro, o Brasil já detém uma fatia dominante do mercado chinês em diversas commodities, como carne de frango (90%) e soja (70%), o que reduz o espaço para expansão nesses setores.
Segundo, há restrições produtivas. Mesmo sendo altamente eficiente, o agronegócio brasileiro opera próximo de sua capacidade máxima em alguns segmentos, o que dificulta um crescimento rápido para atender a uma demanda extra.
Por fim, guerras comerciais tendem a redirecionar fluxos de comércio, e não necessariamente aumentar a demanda global. Ou seja, a China pode comprar mais do Brasil, mas os EUA buscarão novos mercados — muitas vezes os mesmos atendidos pelos brasileiros, gerando competição indireta.
Análise por Produto
Alguns produtos agrícolas brasileiros apresentam potencial variado diante da atual guerra comercial entre EUA e China:
- Soja e carnes (bovina, suína e de aves): O potencial de crescimento é moderado, já que o Brasil já possui alta participação no mercado chinês, limitando ganhos adicionais.
- Café: Há espaço para crescimento, mas este é impulsionado por fatores internos da China, como a mudança nos hábitos de consumo — o chamado “Efeito Starbucks” —, e não diretamente pela guerra comercial.
- Açúcar: O Brasil já é o principal fornecedor para a China, com pouca concorrência americana. Mesmo assim, pode haver expansão moderada devido ao aumento da demanda por biocombustíveis no país asiático.
Oportunidades em Outros Mercados
As tarifas impostas pelos EUA abrem possibilidades para o Brasil explorar novos mercados, como Japão, México e União Europeia, que podem procurar fornecedores alternativos para produtos agrícolas antes adquiridos dos EUA. Esse é um potencial relevante, mas que requer tempo e esforços diplomáticos para ser concretizado, uma vez que as retaliações podem não ser imediatas.
A postura cautelosa adotada pelo governo brasileiro é acertada. Manter uma diplomacia comercial pragmática, evitando confrontos diretos e aproveitando oportunidades específicas, é a estratégia ideal dada a volatilidade e imprevisibilidade da política comercial dos EUA.
Portanto, embora o agronegócio brasileiro tenha oportunidades reais nesse cenário de guerra comercial, é essencial avaliar as limitações produtivas e os efeitos do redirecionamento das cadeias de suprimentos globais, além de estar atento à concorrência regional. Investir em inteligência de mercado, diversificação de estratégias e abertura de novos mercados será fundamental para mitigar os riscos de um conflito comercial prolongado.