Fraude no INSS é herança velha, mas governo Lula sentirá impacto direto
Golpes contra aposentados se repetem há pelo menos três gestões, mas cenário atual pressiona o Planalto como nunca

A Polícia Federal deflagrou nesta quarta-feira (23) a operação "Sem Desconto", investigando desvios de recursos diretamente dos contracheques de aposentados e pensionistas. Embora as fraudes tenham iniciado em 2016, o caso coloca o governo Lula em uma posição delicada em três diferentes frentes, provocando reações imediatas do Executivo.
No aspecto político, a questão é particularmente sensível por envolver um grupo bastante vulnerável - idosos e pessoas com deficiência - justamente em um momento em que o governo Lula enfrenta séria crise de popularidade. A gravidade da situação ficou evidenciada pela rápida decisão do presidente Lula em exonerar Alessandro Stefanutto da presidência do INSS no mesmo dia da operação veio a tona.
Quanto à dimensão criminal, os dados revelam um cenário preocupante. Apesar de os desvios terem começado durante o governo Temer, e continuado durante o governo Bolsonaro, os desvios tiveram uma escalada significativa em 2023, primeiro ano da atual gestão do petista, com aumento ainda maior em 2024. Este agravamento ocorreu mesmo após o tema ganhar visibilidade na imprensa, ser judicializado e receber acórdãos do Tribunal de Contas da União. Um elemento agravante foi o pedido da Polícia Federal, posteriormente autorizado pela Justiça, para afastamento da cúpula do INSS por supostas omissões no enfrentamento dessas irregularidades.
Na perspectiva fiscal, surge um novo desafio para as contas públicas. O governo enfrentará dificuldades para encontrar aproximadamente R$ 8 bilhões necessários para indenizar os beneficiários lesados durante todo o período das fraudes. Em coletiva de imprensa, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, confirmou que eventualmente esses valores precisarão ser restituídos, após análise individualizada de cada caso.
Esta nova despesa potencial preocupa especialmente os Ministérios da Fazenda e do Planejamento, que já sinalizaram problemas com o arcabouço fiscal nos próximos anos devido ao crescimento dos gastos obrigatórios e à retomada do pagamento integral dos precatórios dentro das metas fiscais.
A auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU) revela a dimensão alarmante do problema. Em entrevistas com 1.300 aposentados de diversas regiões do país, 97% afirmaram não ter autorizado os descontos realizados por associações em seus contracheques. Embora represente apenas uma amostra, o levantamento sugere que o problema possui abrangência nacional.
Os resultados da auditoria contradizem declarações do ministro da Previdência, Carlos Lupi, que havia afirmado que os aposentados poderiam cancelar facilmente os descontos através do site do ministério. Na prática, a CGU identificou obstáculos significativos para o cancelamento, considerando que muitos idosos têm dificuldades com tecnologias digitais e precisam ter certificação "nível ouro" na plataforma gov.br. Há ainda relatos de novos descontos surgindo mesmo após solicitações formais de cancelamento.
O momento é particularmente inoportuno para o governo Lula, que já enfrenta desaceleração econômica, inflação em alta e queda nos índices de aprovação. A revelação de desvios de recursos de aposentados por terceiros, aparentemente facilitados por uma suposta omissão do INSS, representa mais um desafio significativo para a administração federal.