Embrapa alerta: aquecimento global aumenta incidência de pragas nas lavouras brasileiras

Um estudo conduzido pela Embrapa com base em diferentes projeções climáticas mostra que os impactos do aquecimento global sobre a agricultura brasileira vão muito além da temperatura e da produtividade: 46% das doenças que afetam lavouras devem se tornar mais severas até o final do século, afetando diretamente o cultivo de grãos, frutas e hortaliças no país.
A pesquisa se baseia nas estimativas do terceiro e quarto relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que apontam para um aumento de até 4,5°C nas temperaturas médias no Brasil até 2100. A análise levou em consideração a resposta de plantas e patógenos diante de diferentes condições de temperatura e umidade.
Ao todo, foram avaliados 304 patógenos que atacam 32 culturas agrícolas de alto valor econômico para o Brasil, incluindo fungos, vírus, bactérias, oomicetos, nematoides e espiroplasmas. Os cientistas alertam ainda para outro efeito colateral da mudança climática: a proliferação de vetores transmissores dessas doenças, como moscas-brancas, pulgões, cochonilhas, ácaros e tripes, que tendem a se espalhar com mais facilidade em ambientes mais quentes.
“Esta revisão demonstra que os estudos realizados no Brasil, até o momento, têm se baseado na avaliação de impactos sobre problemas fitossanitários. Muitos desses estudos relatam a necessidade de medidas de adaptação que ainda não foram efetivamente adotadas”, alerta o relatório publicado em setembro do ano passado.
Um dos casos citados é o da antracnose, doença provocada pelo fungo Colletotrichum gloeosporioides, que pode ter sua ocorrência intensificada durante períodos chuvosos, especialmente em lavouras de milho, sorgo, manga, caju, cebola, melão, mamão, frutas de caroço e morango.
Além da adaptação dos próprios patógenos e da proliferação dos vetores, o estudo chama atenção para um problema adicional: a possível redução da eficácia dos defensivos agrícolas atualmente disponíveis. “Precisamos desenvolver, com urgência, bioherbicidas e produtos biológicos que aumentem a eficiência do uso de nitrogênio e reduzam o estresse abiótico das plantas”, ressalta o pesquisador Wagner Bettiol, da Embrapa Meio Ambiente e um dos autores do trabalho.
A pesquisadora Francislene Angelotti, da Embrapa Semiárido, também envolvida no estudo, afirma que lidar com as doenças em um cenário de mudanças climáticas é um desafio multidimensional, que exige não apenas pesquisa contínua, mas também ações práticas no campo. “O enfrentamento desses desafios exige políticas públicas eficazes e um esforço coordenado entre agricultores, cientistas e governos para garantir a segurança alimentar e a sustentabilidade do setor agrícola”, defende.