323 aliados de Lula têm salários turbinados em conselhos de estatais

Agência Brasil
323 aliados de Lula têm salários turbinados em conselhos de estatais Reprodução

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva garante uma renda adicional a 323 aliados que foram nomeados para conselhos de estatais ou de empresas privadas das quais a União detém ações. Esses cargos proporcionam pagamentos apenas pela participação em reuniões dos colegiados, que acontecem periodicamente em intervalos determinados por cada organização. 

Com esses adicionais, os salários podem ultrapassar R$ 80 mil. Esse benefício se estende a ministros, secretários-executivos, chefes de gabinete, assessores do Palácio do Planalto, servidores comissionados, dirigentes do PT, ex-parlamentares do partido e até a pessoas indicadas pelo Congresso.

Ao ser questionado, o Planalto afirmou que as nomeações obedecem às exigências da Lei das Estatais e são avaliadas pelos comitês de elegibilidade das empresas, que conferem a conformidade dos processos de indicação.

Para entender a composição da “turma dos conselhos”, o Estadão realizou, no último mês, mais de 40 solicitações baseadas na Lei de Acesso à Informação, além de cruzar dados das empresas e examinar documentos de ministérios da administração petista.

Foram contabilizados conselheiros com mandatos vigentes até o dia 15 de abril e que ocupam ou já ocuparam cargos de indicação política no Executivo federal durante o atual governo de Lula. Também foram incluídos aqueles associados aos partidos da base governista e às principais lideranças do Congresso, como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), seu antecessor Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).

Conselhos fiscais e de administração desempenham papéis cruciais em decisões estratégicas. Em empresas privadas, seus membros geralmente possuem vasta experiência em gestão e conhecimentos especializados nos setores em que atuam. Nas empresas sob influência estatal, por outro lado, parte desses cargos é ocupada por pessoas sem a competência técnica necessária, devido ao seu apadrinhamento político e como uma forma de aumentar salários.

Um exemplo é Débora Raquel Cruz Ferreira, chefe de gabinete da Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST), vinculada ao Ministro da Gestão. Formou-se em jornalismo e é conselheira da Empresa Gerencial de Projetos Navais (EMGEPROM). Esta empresa, fundada em 1982, é administrada pelo Comando da Marinha e tem a missão de “promover a indústria militar naval brasileira”.

Antes de assumir o cargo na pasta liderada por Esther Dweck, Débora atuou como assessora de imprensa no Ministério dos Esportes. Ela desempenhou essa função também em outras instituições, como a Câmara, o governo do Distrito Federal e um sindicato de trabalhadores da saúde da capital.

Por sua vez, Lucas Monteiro Costa Dias, que é diretor de programa na Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), possui graduação em história e sua experiência profissional é predominantemente voltada para o assessoramento de políticos de esquerda. Mesmo assim, ele se tornou conselheiro fiscal da Caixa Cartões, uma subsidiária da Caixa Econômica Federal. Este cargo lhe proporciona uma renda extra mensal de R$ 5.430,87, valor que é conhecido como “jeton” e serve para complementar os salários de servidores públicos que ocupam posições em conselhos.

Em seu currículo, Costa Dias ressalta sua especialização em “relações públicas, mediação de conflitos, demandas de entidades da sociedade civil e planejamento e execução de projetos de organizações não governamentais”. 

As funções desempenhadas são bastante diferentes daquelas que foram divulgadas pela empresa para a qual ele trabalha, que é voltada para a administração de participações societárias e para a exploração do mercado de meios de pagamento.

O Ministério de Portos e Aeroportos nomeou Felipe Matos, que é secretário de Desenvolvimento Econômico da prefeitura de Recife (PE), para a Companhia das Docas do Rio Grande do Norte (Codern), sem que haja qualquer vínculo com a gestão da empresa estatal.

O chefe da pasta, Silvio Costa Filho (Republicanos), que é natural de Pernambuco, é um dos principais apoiadores do prefeito João Campos. A indicação de Matos foi feita pelo partido Republicanos, do qual o ministro faz parte, para a administração municipal.

Em resposta ao solicitado esclarecimento do Estadão, o governo justificou que é cada vez mais recomendado que os conselhos tenham profissionais de diferentes formações”, mesmo em companhias privadas. “Essa pluralidade está em consonância com as melhores práticas de governança corporativa e tem papel estratégico para que essas empresas sigam sendo sustentáveis e cumprindo seu papel no desenvolvimento do país.”

A Prefeitura de Recife afirmou que Matos possui experiência na área de concessões, tendo trabalhado em estudos de viabilidade para diferentes tipos de infraestrutura, inclusive portos.

O Ministério de Portos e Aeroportos comunicou que a indicação atendeu a todos os critérios técnicos e legais e que o conselheiro não precisa ser oriundo do estado onde a CODERN atua.

Sandro Cabral, professor de estratégias e gestão pública do Insper, aponta a existência de lacunas na legislação que possibilitam ao governo a nomeação de aliados, mas questiona a qualidade das decisões tomadas na administração pública.

“A questão é: essas pessoas ocupariam cargos similares em empresas privadas sem ingerência do governo? Acho que em alguns casos sim. Mas, no final das contas, boa parte desses conselhos acaba servindo para complementação de salários e apoio político, para agradar a base aliada.”

Ele também avalia que a quantidade de políticos em conselhos é, em parte, consequência de iniciativas de indução da economia pelo setor público.

“É um pouco consequência do modelo de desenvolvimento do Brasil. Apesar das privatizações que houve no passado, a participação do Estado na economia não necessariamente diminuiu. O governo manteve sua atuação em empresas via golden shares e participações do BNDES e de fundos de pensão.”

Para o professor de direito da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Luis André Azevedo, as indicações devem observar também o princípio da eficiência, além de apenas atender a balizas legais.

“Apesar de não haver na Lei das Estatais a exigência de experiências profissionais ou acadêmicas específicas, o melhor é que a pessoa tenha atuação prévia ou formação na área em que a empresa trabalha. Uma regra muito rígida pode engessar a administração, mas é preciso ancorar a escolha (dos conselheiros) no princípio da eficiência.”

Ele reconhece que, em negócios privados, é comum a composição de conselhos acomodar diferentes perfis, mas alerta para a falta de critérios mínimos. “Os conselhos de administração são cargos de senioridade, o que se traduz em experiência e formação. Gera estranheza ver pessoas que não têm uma coisa nem outra nesses cargos.”

A preferência por aliados em vez de especialistas técnicos também se observa entre os membros de alto escalão. Um exemplo disso é a nomeação de Anielle Franco, formada em letras e atual ministra da Igualdade Racial, para o conselho de administração da Tupy, uma empresa metalúrgica multinacional em que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) possui ações.

No ano anterior, a empresa concedeu R$ 4,28 milhões em remunerações aos membros do conselho, o que representa, em média, R$ 39 mil mensais para cada um deles. Antes de assumir um cargo no governo, Anielle atuava como professora de inglês em escolas do Rio de Janeiro e foi diretora do Instituto Marielle Franco, uma ONG dedicada à defesa dos direitos humanos.

Em resposta, a pasta informou que “Anielle Franco tem experiência em gestão institucional, é referência nos debates sobre diversidade, ações afirmativas e direitos humanos nacional e internacionalmente e é ministra de estado da agenda da Igualdade Racial no Brasil, tendo, portanto, condições de promover reais e ricas contribuições ”

Além dela, conforme divulgado pelo Estadão, os titulares da Previdência, Carlos Lupi, e da Controladoria-Geral da União, Vinícius Marques de Carvalho, também conquistaram cargos na empresa. Vale ressaltar que Vinícius já integra o conselho de administração da Brasilcap, que é uma subsidiária do Banco do Brasil. Juntando o salário de ministro, que é de R$ 44 mil, aos jetons da Tupy e da Brasilcap, seu salário pode alcançar até R$ 83 mil em um único mês.




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